O criticado vídeo postado pelo youtuber americano Logan Paul, mostrando o corpo de uma aparente vítima de suicídio no Japão, abriu um debate sobre privacidade e respeito nas redes sociais. Mas também, inadvertidamente, colocou em evidência uma questão que já vinha preocupando as autoridades japonesas.
O bosque de Aokigahara, onde Paul e seus amigos gravaram imagens do corpo (enquanto riam e faziam piadas), é conhecido no Japão como o local onde dezenas de pessoas vão, anualmente, para tirar as próprias vidas. O número exato de mortes no local não é divulgado, justamente para não estimular as pessoas a buscarem Aokigahara com a intenção de se suicidar.
O Japão tem uma das taxas de suicídio mais altas do mundo, apesar de o número de casos ter diminuído. Em 2016, foram registradas, segundo relatórios oficiais, 21,8 mil mortes, menor número em mais de duas décadas.
O bosque dos suicidas
O bosque é localizado a noroeste do icônico Monte Fuji - a cerca de 100 km de Tóquio - e se espalha por 30 quilômetros quadrados em uma região de solo de lava escura enrijecida, resultado da última grande erupção do vulcão, no ano de 864.
A região é tradicionalmente associada com a morte: acredita-se que o local tenha sido usado anteriormente para o antigo costume de ubasute, em que idosos eram abandonados para morrer em épocas de escassez de alimentos e de seca prolongada.
O costume resultou em uma lenda de que os fantasmas dos idosos habitam o local.
Mas foi só nas últimas décadas que o local passou a ser visto como um ponto de suicídios. Algumas autoridades japonesas atribuem isso ao livro Tower of Waves (sem tradução em português), romance de 1961 do escritor Seicho Matsumoto, em que um casal de amantes tira a própria vida na floresta.
Interesse de Hollywood
Posteriormente, um polêmico e popular livro dos anos 1990 do escritor Wataru Tsurumi descreveu Aokigahara como "o lugar perfeito para morrer".
O bosque acabou atraindo a atenção de Hollywood, inspirando ao menos dois filmes com sua reputação macabra. Trata-se de O Mar de Árvores (2015), drama de Gus Van Sant com Matthew McConaughey ambientado em Aokigahara, e o filme de terror de 2016 Floresta Maldita.
Além disso, diversos programas de TV ao redor do mundo foram dedicados a explorar a triste reputação desse bosque.
Filme 'Floresta Maldita' mostra um dos cartazes focados na prevenção ao suicídio em Aokigahara | Foto: Gramercy Pictures |
Silêncio
Com vegetação densa e ausência quase absoluta de vida selvagem, Aokigahara impressiona pelo silêncio e por suas curiosas formações rochosas.
O bosque é repleto de cartazes oferecendo informações sobre atendimento telefônico anti-suicídio e serviços de atendimento psicológico. Alguns também pedem aos visitantes que reflitam sobre "o presente que é a vida e a dor que você podem causar a sua família".
Autoridades japonesas também patrulham o local para identificar potenciais suicidas, além de instalar câmeras de segurança.
Trabalhadores do comércio local também se voluntariam nos esforços de prevenção ao suicídio. O dono de um café na entrada do bosque disse ao jornal Japan Times já ter salvado cerca de 160 pessoas ao longo dos 30 anos em que trabalha ali. Sua estratégia consiste em ficar de olho nos visitantes que chegam desacompanhados.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 800 mil pessoas cometem suicídio anualmente no mundo - ou uma pessoa a cada 40 segundos.
Em 2015, o Japão registrava a taxa de suicídios de 19,7 a cada 100 mil pessoas, uma das mais altas entre os países desenvolvidos (no Brasil, a taxa contabilizada pela OMS no mesmo ano era de 6,3).
Estudiosos ressaltam a complexidade do tema e veem motivos diversos. Se a solidão costuma ser a causa principal de depressão e suicídio entre idosos, os mais jovens enfrentam dificuldades em lidar com estresse e insegurança financeira.
Segundo dados de 2010 da polícia japonesa, 57% dos que tentaram suicídio naquele ano estavam desempregados.
Além disso, diferentemente de outros países, o Japão tem a tradição de honrar o suicídio - e não tem nenhuma cultura religiosa que o condene.
O polêmico vídeo
De volta ao vídeo de Logan Paul, as fortes críticas levaram o youtuber a postar um vídeo pedindo desculpas pela gravação que fizera no Japão, que foi deletada de suas redes sociais.
O polêmico vídeo mostra Logan Paul e amigos na floresta de Aokigahara, na base do Monte Fuji, conhecida como um local com frequentes suicídios. Ao entrar para filmar o que chamavam de "floresta mal-assombrada", eles se depararam com um corpo. O grupo então demonstra choque, mas também faz piadas. O vídeo de 15 minutos de Logan Paul faz parte de uma série de postagens sobre uma viagem dele com amigos pelo Japão.
A visita à floresta tinha a intenção de explorar o aspecto "mal-assombrado" do local, diz o vídeo. Após caminhar alguns metros pela mata, o grupo se depara com o corpo. Os jovens são filmados se aproximando da pessoa morta, que aparece em diversos closes com o rosto desfocado.
Um integrante do grupo é ouvido dizendo que não se sentia muito bem. Paul Logan, então, pergunta: "Que isso? Você nunca esteve perto de um cara morto?". Em seguida, ele ri.
A identidade do homem morto é desconhecida até o momento.
Embora algumas pessoas tenham dito que o vídeo ajudou a trazer conscientização para a questão do suicídio de jovens, a grande maioria das manifestações foi negativa.
Ele foi acusado de agir de forma inapropriada e desrespeitosa. Alguns pediram seu canal fosse removido do YouTube.
Algumas pessoas defendem que a polêmica é um exagero, afinal de contas basta digitar "Aokigahara" no google imagens para aparecerem diversas fotos de cadáveres na tal floresta. Já quem defende que o youtuber deva ser punido, afirma que o problema reside na forma desrespeitosa com que ele tratou o cadáver em seu vídeo. Outros afirmam que o YouTube é um espaço família e que tais conteúdos não deveriam fazer parte da rede de vídeos.
Estranhamente nos últimos tempos vários youtubers que criam vídeos de terror tem se queixado de que alguns de seus vídeos são derrubados pelo YouTube sob alegação de que contém assuntos ofensivos, mas até agora o YouTube, que paga aos provedores de conteúdo por vídeos que atingem um determinado número de visualizações, ainda não se manifestou oficialmente sobre o caso. Lembrando que Paul tem 15 milhões de seguidores no YouTube.
Um abaixo-assinado pedindo a exclusão de seu canal foi assinado por 45 mil pessoas.
Em resposta, Paul postou uma mensagem de desculpa no Twitter: "Estou cercado de pessoas boas e acredito que tomo decisões corretas, mas sou um ser humano. Eu posso cometer erros".
Ele disse que queria causar um "efeito positivo na internet", não uma onda de "negatividade". Segundo o youtuber, sua intenção era conscientizar sobre o suicídio e sua prevenção.
"Nunca recebi críticas como essas, porque nunca cometi um erro assim antes", afirma. Paul também argumenta que não ganhou dinheiro com a divulgação do vídeo.
Fontes: BBC e Wikipédia
Quando amanhecer, você já será um de nós...
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